A imunoistoquímica é o conjunto de procedimentos que utiliza anticorpos como reagentes específicos para a detecção de antígenos presentes em células ou tecidos. Os antígenos podem representar constituintes celulares normais (p. ex., uma proteína de membrana) ou pertencer a um elemento estranho à célula (p. ex., um microorganismo). A imunoistoquímica é uma técnica essencialmente qualitativa. Embora métodos quantitativos possam ser aplicados em preparações imunoistoquímicas para se determinar o número de elementos presentes ou a intensidade da reação, seu objetivo fundamental é o encontro e localização topográfica de antígenos nos tecidos ou células. O produto da reação imunoistoquímica deve sempre ser interpretado em conjunto com os achados morfológicos e não simplesmente em termos de reação positiva e negativa. Na patologia a imunoistoquímica assume papel de fundamental importância. As neoplasias são neoformações teciduais que apesar de se originarem em tecidos normais, muitas vezes perdem sua capacidade de diferenciação celular (no caso das malignas), tornando impossível ou duvidoso um diagnóstico morfológico baseado nas características da forma da lesão. Daí a necessidade da imunoistoquímica para elucidar a origem tecidual e, portanto o diagnóstico da lesão.
PRINCÍPIO FUNDAMENTAL
Os anticorpos empregados podem ser mono ou policlonais. Para seu reconhecimento, os anticorpos devem estar marcados com algum composto que depois possa ser visualizado seletivamente. Os anticorpos policlonais são produzidos, in vivo, por diferentes células e, portanto são diferentes quanto às propriedades imoquímicas; reagem com várias moléculas (epítopos) diferentes, presentes no antígeno contra o qual foram produzidos. Os anticorpos monoclonais são produzidos, in vitro, por clones de células plasmáticas imortalizadas. Ao contrário dos policlonais reagem apenas com uma molécula (epítopo) presente no antígeno. Inúmeras vantagens apoiaram o largo uso de anticorpos monoclonais em imunoistoquímica: são altamente homogêneos, a ausência de reatividade inespecífica e alta reprodutibilidade lote a lote. A partir da década de 1960, surgiram as técnicas imunoenzimáticas, ou seja, as que empregam imunoglobulinas marcadas com enzimas.
PROCESSAMENTO DO MATERIAL
Fixação e processamento de materiais para imunoistoquímica
A fixação do fragmento deve ser feita pela formalina tamponada a 10%. A formalina deve ser fresca e tamponada a um pH 7,0 a 7,6. Devido ao problema de mascaramento de antígeno, a fixação deve levar o menor tempo possível para obter-se uma boa morfologia, normalmente de 12 a 24 horas. Após a fixação, as amostras de tecido devem ser desidratadas, limpas e inclusas de acordo com os procedimentos de rotina de processamento. Para se obter os melhores resultados em imunoistoquímica, as amostras devem ser inclusas em parafina pura, pois esta pode ser completamente e facilmente removida do tecido no momento da coloração. A inclusão consta de várias etapas: desidratação, diafanização e impregnação. Como a parafina é um composto não miscível na água a primeira etapa da inclusão (desidratação) se dedica à retirada da água dos tecidos e sua substituição por álcool, na segunda etapa (diafanização), o álcool presente nos tecidos é substituído por xilol e, finalmente na impregnação o xilol é substituído por parafina fundida a 60°C.
Tabela 1- Etapas da inclusão
Passo | Solução | Tempo* (em média) |
Desidratação | Álcool 96% | 1 hora |
Álcool absoluto I | 1 hora | |
Álcool absoluto II | 1 hora | |
Álcool absoluto III | 1 hora | |
Diafanização | Xilol I | 1 hora |
Xilol II | 1 hora | |
Inclusão | Parafina 60ºC I | 30 min. |
Parafina 60ºC II | 30 min. |
* O tempo é bastante variável, depende do tamanho e do tipo de material a ser processado.
Uma vez impregnados, os tecidos são colocados em pequenos recipientes contendo parafina fundida permitindo que esta possa se endurecer. A partir daí passam a ser chamado de blocos.
Microtomia
É esta a etapa mais importante e difícil da técnica histológica e consiste basicamente em obter cortes sucessivas dos blocos de parafina contendo fragmento de órgãos. Estes cortes são obtidos graças ao uso do aparelho micrótomo. Os cortes histológicos devem ter de 2 a 3 µm de espessura. As fitas de parafina obtidas no processo de corte pela microtomia são cuidadosamente colocadas em banho-maria histológico e os cortes depositados em lâminas previamente tratadas com 3-aminopropiltrietoxisilano (APTS). As lâminas com os cortes são levados á estufa a 60ºC e lá deixadas por 24 horas para melhor adesão do tecido.
Procedimentos imunoistoquímicos
Os cortes passarão por 3 banhos de xilol, por pelo menos 5 minutos cada, e 3 banhos de álcool absoluto ( 10 segundos em cada) para completar a desparafinização. Por último deixá-las em banho de solução salina tamponada (PBS) por 5 minutos. Após as lâminas permanecerem por pelo menos 5 minutos no PBS, transferi-las para a bandeja. Iniciam-se os procedimentos de bloqueio, recuperação de epítopos e incubação:
· Bloqueio da peroxidase endógena: Procede-se ao bloqueio da peroxidase endógena com solução de peróxido de hidrogênio (H2O2) a 3% em água destilada; seguem-se lavagens em água corrente e PBS.
· Recuperação antigênica: As amostras fixadas em formalina, especialmente quando não foi possível o controle do pH ou do tempo de fixação (superior a 24 horas), requerem recuperação antigênica para grande maioria dos epítopos habitualmente pesquisados. Os principais métodos são: · Digestão enzimática: As lâminas são incubadas com solução de tripsina 30mg% e cloreto de cálcio 134 mg% em PBS em pH 7,8, durante 20 minutos a 37ºC, seguindo-se lavagens em água corrente. · Irradiação por microondas: as lâminas são incubadas em tampão citrato 10mM/pH 6,0, em forno microondas (potência máxima), por 9 minutos (2x); esfriadas por 20 minutos, seguindo-se lavagens em água corrente. · Incubação em calor úmido: as lâminas são incubadas em tampão citrato 10 mM /pH6,0, em panela á vapor, durante 30 minutos, seguem-se lavagens em água corrente. Após as etapas de recuperação de antígeno, as lâminas são mergulhadas novamente na solução salina de PBS. As lâminas são transferidas para a bandeja e são incubadas com o anticorpo específico (policlonal ou monoclonal), diluído em tampão PBS, durante 16 a 18 horas a 4°C, em câmara úmida. Após a incubação durante à noite, as lâminas são lavadas com PBS e os anticorpos secundários são adicionados.
Métodos de coloração: Método ABC ou LSAB
Esses métodos utilizam a alta afinidade da avidina ou estreptoavidina pela biotina. A avidina é uma glicoproteína básica, com um peso molecular de 68.000 e possui 4 sítios de ligação de alta afinidade para biotina. A biotina é uma vitamina com um peso molecular de 244. Assim sendo, o anticorpo secundário empregado nessa técnica, é marcado com biotina e a enzima, pode apresenta-se, sob a forma de um complexo diretamente ligado a avidina ou estreptoavidina. O anticorpo secundário ligado á biotina será incubado ao material por 30 minutos e então se procede com novas lavagens em PBS. Acrescenta-se o complexo estreptoavidina, que vem conjugado a peroxidase, ocorre a incubação por mais 30 minutos. E novamente realiza-se lavagem com PBS.
Sistema de Revelação
Atualmente diversos sistemas de revelação com sensibilidades diferentes estão disponíveis no mercado brasileiro. O 3,3’-Diaminobenzidine (DAB) é uma substância cromógena que é utilizada para evidenciar uma reação semelhante à usada para revelar fotografias radiográficas. O DAB reage com a peroxidase contida no complexo avidina-biotina-peroxidase, precipitando-se no local, numa coloração acastanhado. Após incubação com o complexo LSAB, lavar as lâminas com PBS, sugando o excesso e pingando a solução de DAB, permitindo que essa fique por 5 minutos. Finalizado esses 5 minutos as lâminas deverão ser mergulhadas em água corrente, contracoradas em hematoxilina, hidratadas, diafanizadas e montadas com bálsamo.
PRINCIPAIS MARCADORES
- Actinas de Músculo Liso (1A4) e Muscular (HHF35): são microfilamentos citoplasmáticos, com vários isotipos com diferentes especificidades celulares – actinas alfa, presentes em células musculares, actinas beta em células não musculares e actinas gama, presentes tanto em células musculares quanto em não musculares.
· Alfa-1-Antitripsina (AAT): marcadores histiocitários, principalmente das formas macrofágicas.
· Alfa-1-Fetoproteína (AFP): proteína oncofetal, presente em tumores de células germinativas.
· CA 19-9: Marcador que reage com uma pentose na superfície celular. Usualmente um marcador para carcinoma de pâncreas e tubo digestivo, mas apresenta positividade freqüente em outros carcinomas.
· CA 125: Antígeno do câncer ovariano positivo na maioria dos carcinomas de ovário, principalmente nos serosos, e em menor proporção nos mucinosos.
· Antígeno carcinoembrionário (CEA): sua grande aplicação se deve á sua secreção pelo carcinoma de cólon. · CD 3 e CD 5: molécula ligada ao receptor de células T, é um dos marcadores mais sensíveis e específicos para demonstração de diferenciação T.
· CD 15 (célula de Reed-Sternberg): reage com antígenos encontrado em granulócitos maduros
· CD 20, célula B (L 26): o melhor e mais usado marcador pan-B.
· CD 30, antígeno Ki-1: é expresso pelas células neoplásicas de quase todos os casos de Doença de Hodkin, pela maioria dos linfomas anaplásicos de grandes células e por uma proporção variável de linfócitos T e B ativados.
· CD 31: Glicoproteína expressa em células endoteliais.
· CD 34: Marcador de células hematopoiéticas primitivas e de células endoteliais.
· CD 43: célula-T: marcador muito sensível para célula T.
· CD 45RB: antígeno leucocitário comum (LCA): glicoproteína transmembrânica restrita aos leucócitos.
· CD 45 RO: Altamente sensível para linfomas de baixo grau.
· CD 57: marcador de células natural Killer.
· CD 61: Reage com glicoproteínas presentes nas plaquetas humanas e megacariócitos.
· CD 68 (Macrófago): É um pan-marcador histiocítico, sendo encontrado no citoplasma de células mielóides e macrófagos.
· CD 99: É encontrado em todos os sarcomas de Ewing Marker e na grande maioria dos tumores neuroectodérmicos primitivos periféricos.
· Ciclina D1: Linfoma de células do manto.
· Citoqueratina (AE1/AE3, 34bE12, 35bH11, CK7 e CK20): são os marcadores epiteliais, tendo sua principal utilidade em baterias para neoplasia indiferenciadas.
· Colágeno tipo IV: Pode ser usado na diferenciação de tumores de músculo liso e de bainha neural de outros tumores fusocelulares.
· Desmina: É o marcador mais específico para diferenciação muscular em tumores, pois não marca células mioepiteliais e miofibroblastos.
· Antígeno de membrana epitelial (EMA): Marcador de diferenciação epitelial, presente em grande parte dos adenocarcinomas.
· Fator VIII: Anticorpo altamente específico para demonstração de diferenciação vascular.
· Proteína acídica fibrilar glial (GFAP): Marca astrócitos normais reativos e neoplásicos.
· Proteína fluida da grande doença cística (GCFDP-15): Marca mais da metade dos carcinomas primários e metastáticos da mama.
· HMBE-1- Células mesoteliais: marca células mesoteliais normais.
· Gonadotrofina coriônica humana (hCG): Marcador de células germinativas.
· Infecção: marcador de doenças infecciosas: numerosos marcadores para doenças infecciosas estão em constante desenvolvimento.
· Ki-67, Mib1: Marca uma proteína presente em todas as fases do ciclo celular, menos na fase G0.
· Melanoma (HMB45): É altamente específico para diferenciação melanocítica em tumores malignos.
· Myo D1: Proteína reguladora miogênica, mostrando-se útil em rabdomiossarcomas.
· Neurofilamento 68 KD (NF): Usados na evidenciação de diferenciação neuronal ou neuroendócrina, são úteis no diagnóstico de neuroblastoma.
· PGP 9.5
· PLAP (fosfatase alcalina placentária): Marca toda a gama de neoplasias de células germinativas.
· Antígeno prostático específico (PSA): Marca o epitélio prostático normal e seus carcinomas.
· Proteína S-100: Marca todos os melanomas, e na evidenciação de diferenciação para bainha de nervo periférico.
· Sinaptofisina (SYP): Marca vesículas pré-sinápticas dos neurônios e nos grânulos neurosecretórios das células neuroendócrinas.
· Vimentina: Marcam muitos carcinomas principalmente os renais, endometriais, pulmonares e mamários.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- ALVES, VAF; BACCHI, CE; VASSALO, J – Manual de imunohistoquímica. São Paulo: Sociedade Brasileira de Patologia – 1999
